Prefácio de Matthias Hartwig (Dr. iur., Pesquisador Sênior do Instituto Max Planck [MPIL, Heidelberg], autor da obra de referência na área: “Die Haftung der Mitgliedstaaten für Internationale Organisationen, Springer-Verlag, 1993”):
As organizações internacionais tornaram-se um dos mais revolucionários fenômenos do direito internacional. Os Estados como sujeitos clássicos do direito internacional provaram estar, em muitos aspectos, inaptos a responder aos desafios atuais. Proteção ambiental, direito do comércio internacional, telecomunicações, tráfego aéreo ou manutenção da paz, para dar alguns poucos exemplos, não podem ser tratados por um Estado isoladamente, pois os respectivos problemas não se circunscrevem a um único Estado. De outro lado, negociações interestatais, tratados bilaterais e conferências de Estados não conseguem enfrentar as rápidas mudanças produzidas na contemporaneidade. Em consequência disso, a cooperação internacional foi sendo institucionalizada e as organizações internacionais tiveram de compensar os deficits dos Estados no encaminhamento das questões e, em algumas áreas, acabaram substituindo-os em suas funções tradicionais.
As organizações internacionais configuraram-se atores proeminentes à luz do direito internacional, à medida que elas não somente cumpriram as suas funções, mas quando também passaram a adquirir direitos e obrigações. Intimamente vinculada às obrigações para a ciência do direito encontra-se a noção de responsabilidade, posto que do descumprimento de uma obrigação resulta a responsabilidade do sujeito de direito que deveria respeitá-la. Esse conceito fundamental demonstra-se também aplicável às organizações internacionais, nada obstante o detalhamento da responsabilidade dessas instituições ainda permanecer sob discussão, haja vista não estar completamente claro em que extensão os princípios relativos aos Estados podem ser transferidos às organizações institucionais. Apesar de ter havido incidentes e casos contenciosos nos quais foi abordada a questão da responsabilidade das organizações internacionais, um sistema jurídico completamente desenvolvido ainda não foi alcançado. As pesquisas acadêmicas apenas iniciaram a tentativa de encontrar respostas para esse problema, mesmo considerando que a importância do assunto possa ser extraída do atual trabalho da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas sobre o tópico, a qual ainda não concluiu o respectivo projeto até o presente momento (2010).
Levando em consideração a importância crescente da matéria, o livro de Ranieri L. Resende que é dedicado ao tópico de responsabilidade das organizações internacionais ostenta grandes méritos. O autor recupera as raízes da responsabilidade e proporciona uma visão geral de como essa concepção desenvolveu-se com referência aos Estados e, mais tarde, com relação às organizações internacionais. Na realidade, é impossível compreender o atual estado do direito sem se ater ao passado. Para tanto, a análise das normas internacionais e da prática dos Estados relacionados à responsabilidade das organizações internacionais demonstra até onde o direito internacional desenvolveu-se nessa seara. Portanto, a aplicação dessa normativa à Organização Mundial do Comércio (OMC) atrai grande interesse.
A OMC transformou-se nos recentes anos em uma das mais poderosas e importantes organizações internacionais. As regras do comércio internacional, que são largamente formuladas pela OMC, regulam uma das pedras angulares das relações internacionais. As amplas funções e poderes da OMC não apenas fazem dessa organização uma instituição forte na arena internacional, como também aumentam a probabilidade de violação das suas obrigações e, consequentemente, o envolvimento de sua própria responsabilidade. Tendo em vista que as decisões da OMC podem infligir tanto direitos de pessoas privadas quanto de Estados, o modelo adotado é capaz de trazer à luz diversas faces da responsabilidade das organizações internacionais.
O livro oferece uma interessante apreensão acerca da responsabilidade das organizações internacionais como a matéria se encontra hoje, apresenta uma série de exemplos da atual aplicação desse conceito, além de contribuir para uma melhor compreensão do fenômeno. A obra certamente auxiliará a desenvolver ainda mais o direito internacional, em um campo que se moveu para o centro dos interesses.
Foreword of Matthias Hartwig (Dr. iur., Senior Researcher at the Max Planck Institute [MPIL, Heidelberg], author of the authoritative book: “Die Haftung der Mitgliedstaaten für Internationale Organisationen, Springer-Verlag, 1993”):
International organizations have become one of the most revolutionary phenomena of international law. States as the classical subjects of international law proved to be in many respects inapt for responding to the challenges of today. Environmental protection, international trade law, telecommunication, air traffic or the maintenance of the peace, to give just few examples, cannot be handled by a single State because the respective problems are not located within one State. Interstate negotiations, bilateral treaties, State conferences cannot cope with the quickly changing questions raised in modern times. Therefore, international cooperation has been institutionalized. International organizations had to compensate the deficits of the States in addressing the problems and in some areas they replaced them in their traditional functions.
International organizations became prominent actors under international law. As such they did not only fulfil functions but they also got rights and duties. Closely attached to the duties in law is the notion of responsibility. The non-fulfilment of a duty entails the responsibility of the legal subject which had to respect it. This basic concept is also applicable to the international organisations. However, the details of the responsibility of international organisations are still under discussion. It is not quite clear, to what extent the principles relating to States can be transferred to international organizations. There have been some incidents and cases which dealt with the question of the responsibility of international organizations. But a full-fledged system of responsibility has not yet been accomplished. The scholarship just started to try to find answers to this problem. The importance of the matter might be derived from the actual work of the International Law Commission on the topic, which has not yet finished its draft (2010).
Taking into consideration this growing importance of the matter the book by Dr. Ranieri Lima Resende that is dedicated to this topic bears great merits. The author retrieves the roots of responsibility and gives an overview how this concept developed for the States and later for international organizations. It is indeed impossible to understand the actual state of the law without paying attention to the past. The analysis of the norms and the State practice relating to the responsibility of international organisations shows to what extent the international law in this field has developed. The application of the rules to the WTO draws a great interest.
The WTO has become in the recent years one of the most powerful and most important international organizations. The rules of international trade are widely formulated by the WTO, and international trade is one of the corner stones of international relations. The broad functions and powers of the WTO make this organisation not only quite powerful in the international arena, but it likewise increase the probability to violate its duties which will entail responsibility. As the decisions of the WTO may inflict the rights of private persons as well as those of States, the example may show various facades of the responsibility of international organisations.
The book offers a good insight into the responsibility of international organizations as it stands today, it shows a lot of examples of the actual application of this concept, and it contributes to a better understanding of the phenomenon. So it will help to develop further the international law in a field which moved into the centre of interest.
[Livro de autoria de Ranieri L. Resende]
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