A Constituição Federal brasileira, promulgada em 1988, traz em seu cerne a preocupação com a cidadania e os direitos humanos. Tanto é que entre seus fundamentos está a proteção à vida e à dignidade, garantindo peso supralegal (e, às vezes, até constitucional) aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos ratificados pelo Congresso Nacional.
Ranieri Lima Resende, doutorando da Faculdade Nacional de Direito (FND) e pesquisador visitante da Universidade de Nova Iorque (NYU), investiga como as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, instituição autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA), influenciam os pareceres jurídicos dos países latino-americanos. “Minha pesquisa nasceu da constatação de que a temática contemporânea dos direitos humanos permeia praticamente todos os debates sobre políticas públicas e auxilia a própria definição de quais são as atuais funções do Estado.”
Hoje, cortes como a Interamericana, e também a Europeia, têm se posicionado de maneira firme ao precisar limites de atuação dos países, definindo parâmetros de efetividade dos direitos fundamentais. Um exemplo, segundo o pesquisador, é a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a inexigibilidade do diploma para exercer a carreira de jornalista. “Em seus fundamentos, o Supremo adotou expressamente a opinião consultiva da Corte Interamericana para sustentar a inviabilidade constitucional de aplicar tais exigências ao jornalista”, conta.
Mesmo com dispositivos constitucionais que apontam para a priorização dos direitos humanos, o Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana e, até hoje, é inadimplente no cumprimento das decisões judiciais, sendo o primeiro país condenado por escravidão moderna. O caso da Fazenda Brasil Verde ficou conhecido pela escravização de trabalhadores, submetidos a jornadas exaustivas de trabalho, carteira de trabalho retida, alimentação de péssima qualidade, salários irrisórios e falta de acesso à saúde, energia e saneamento básico. A corte exigiu punição dos envolvidos, mas até hoje nenhum responsável foi preso, e os trabalhadores sequer indenizados.
Resende também inclui os direitos ambientais e à saúde no rol das prerrogativas à dignidade humana, abordando casos como o da exploração de amianto no país. A extração do composto causa grande impacto ambiental, e o produto, altamente cancerígeno, tem sua venda e aplicação proibidas em boa parte do mundo.
[Entrevista de Ranieri L. Resende concedida a Carolina Correia]
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